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O dia amanheceu cinza. Não aquele cinza bonito, que parece um cobertor de calma sobre o mundo, mas o cinza pesado — o que vem carregado de silêncio e desânimo. Marina olhou pela janela e teve vontade de ficar ali, parada, observando a chuva que caía como se lavasse as horas que ela não queria viver.
Tinha sido uma semana dura. Daquelas que parecem ter mais de sete dias, com o peso dobrado em cada um. As coisas não iam bem no trabalho, um mal-entendido com uma amiga havia lhe tirado o sono e, para completar, aquele vazio que aparece de vez em quando — sem nome, sem explicação — resolveu fazer morada em seu peito.
Ela respirou fundo.
Lembrou-se de uma frase que lera certa vez, atribuída a Shakespeare:
“Aconteça o que acontecer, os dias ruins passam, assim como todos os outros.”
Era simples. Quase óbvio. Mas naquele momento, soou como um abrigo.
Marina se lembrou de quantas vezes acreditou que não suportaria alguma dor — e suportou. Quantas noites chorou achando que o dia seguinte não traria luz — e trouxe. Quantas perdas pareciam o fim — e foram apenas o início de uma nova fase.
O tempo tem esse dom silencioso de transformar.
Ele não pergunta se estamos prontos, apenas segue.
E ao seguir, leva um pouco do que pesa, do que arde, do que fere.
Marina enxugou o rosto. O café esfriava na xícara, mas o coração começava a se aquecer. Abriu a janela e deixou o vento entrar, trazendo o cheiro da terra molhada. Era quase como um lembrete: o que parece o fim, muitas vezes, é apenas o recomeço esperando paciência.
E então ela sorriu, um sorriso pequeno, mas sincero.
Sabia que o dia continuaria cinza, mas agora havia uma diferença: ela já podia enxergar, em algum ponto distante, o brilho do amanhã.
Porque — aconteça o que acontecer — até os dias ruins passam.
Assim como todos os outros.
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