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sábado, 16 de agosto de 2025

❔O que é que ainda me prende?

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Há dores que preferem ficar quietas, escondidas em algum canto do peito como hóspedes indesejados que, ainda assim, se recusam a partir. No começo, acreditamos que ignorá-las seja a melhor solução: fechar a porta, varrer para baixo do tapete, seguir adiante como quem não ouviu o chamado. Parece mais fácil. Parece menos doloroso. Mas o silêncio cobra caro.

Não interrogar nossas angústias é como viver em uma casa cheia de portas trancadas sem nunca procurar as chaves. Habitamos apenas alguns cômodos, acreditando que o espaço seja pequeno, quando, na verdade, o horizonte é vasto. Adiamos a liberdade, como se ela fosse uma visita que ainda não está pronta para chegar.

E a verdade é que, por mais incômoda que seja, a angústia é também um convite. Ela não vem para destruir, mas para apontar o que está fora do lugar, o que exige coragem para ser visto. Interrogar a própria dor é, no fundo, interrogar a própria vida: perguntar-se o que ainda falta, o que ainda dói, o que precisa ser transformado para que o peso deixe de ser corrente e se torne asa.

O preço de não perguntar é a repetição. É viver em círculos, refazendo os mesmos caminhos, sentindo as mesmas faltas, sufocado pelas mesmas respostas não ditas. A liberdade não está em fugir das perguntas, mas em ter coragem de enfrentá-las — mesmo que tragam verdades que não queríamos ouvir.

E talvez a liberdade comece exatamente aí: no instante em que paramos diante de nós mesmos e, sem medo, perguntamos: o que é que ainda me prende?

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