sexta-feira, 20 de junho de 2025

🖖A vida não é só o que acontece

— Engraçado, né? — disse Clara, olhando para o céu da varanda, onde o sol escapava devagar pelas frestas das nuvens. — A vida parece que empurra a gente pra todo lado… mas no fim, a direção ainda é nossa.

— Você anda pensando muito — respondeu Daniel, sentando ao lado dela com duas xícaras de café. — Aconteceu alguma coisa?

Ela sorriu de leve, sem responder de imediato.

— Hoje eu li uma frase que não saiu da minha cabeça. “A vida não é só o que acontece, mas também o que você decide.”

— Forte isso. — Ele fez uma pausa. — Mas às vezes parece que não temos muito o que decidir, né? Tem coisas que simplesmente… acontecem.

— Sim, claro. Tem o que a gente não controla. Mas e o que fazemos com isso? Isso é escolha. A dor vem, mas alimentar ou curar a dor… é decisão. A solidão aparece, mas se isolar ou procurar alguém… é decisão. Até continuar num lugar onde já não somos mais nós… é.

Daniel ficou em silêncio, olhando o café esfriar nas mãos.

— Você está pensando em ir embora?

— Estou pensando em voltar pra mim. Talvez eu tenha me deixado em algum ponto do caminho, sabe?

Ele engoliu seco. Não era uma conversa comum entre os dois.

— Eu também me perdi de mim — confessou. — Achei que bastava esperar a vida acontecer, como se o tempo fosse consertar tudo.

— Mas o tempo não conserta, Daniel. O tempo só passa.

A gente é que precisa consertar — ou deixar ir, quando for preciso.

Ele respirou fundo.

— E agora? O que você decide?

Clara olhou para o céu novamente, mais leve.

— Decido viver com presença. Decido não ficar em lugar nenhum por medo.

Decido escolher o que me escolhe de volta.

Daniel sorriu, ainda com um nó na garganta.

— Então… talvez seja hora de eu decidir também.

— A vida continua acontecendo, Daniel.

Mas agora, eu quero fazer parte dela como autora, não só como personagem.

Ambos se olharam.

Ali, naquela varanda, entre silêncios e palavras ditas com o coração, duas vidas se reorganizavam.

Não porque algo fora havia mudado.

Mas porque, enfim, decidiram mudar por dentro.

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