— Engraçado, né? — disse Clara, olhando para o céu da varanda, onde o sol escapava devagar pelas frestas das nuvens. — A vida parece que empurra a gente pra todo lado… mas no fim, a direção ainda é nossa.
— Você anda pensando muito — respondeu Daniel, sentando ao lado dela com duas xícaras de café. — Aconteceu alguma coisa?
Ela sorriu de leve, sem responder de imediato.
— Hoje eu li uma frase que não saiu da minha cabeça. “A vida não é só o que acontece, mas também o que você decide.”
— Forte isso. — Ele fez uma pausa. — Mas às vezes parece que não temos muito o que decidir, né? Tem coisas que simplesmente… acontecem.
— Sim, claro. Tem o que a gente não controla. Mas e o que fazemos com isso? Isso é escolha. A dor vem, mas alimentar ou curar a dor… é decisão. A solidão aparece, mas se isolar ou procurar alguém… é decisão. Até continuar num lugar onde já não somos mais nós… é.
Daniel ficou em silêncio, olhando o café esfriar nas mãos.
— Você está pensando em ir embora?
— Estou pensando em voltar pra mim. Talvez eu tenha me deixado em algum ponto do caminho, sabe?
Ele engoliu seco. Não era uma conversa comum entre os dois.
— Eu também me perdi de mim — confessou. — Achei que bastava esperar a vida acontecer, como se o tempo fosse consertar tudo.
— Mas o tempo não conserta, Daniel. O tempo só passa.
A gente é que precisa consertar — ou deixar ir, quando for preciso.
Ele respirou fundo.
— E agora? O que você decide?
Clara olhou para o céu novamente, mais leve.
— Decido viver com presença. Decido não ficar em lugar nenhum por medo.
Decido escolher o que me escolhe de volta.
Daniel sorriu, ainda com um nó na garganta.
— Então… talvez seja hora de eu decidir também.
— A vida continua acontecendo, Daniel.
Mas agora, eu quero fazer parte dela como autora, não só como personagem.
Ambos se olharam.
Ali, naquela varanda, entre silêncios e palavras ditas com o coração, duas vidas se reorganizavam.
Não porque algo fora havia mudado.
Mas porque, enfim, decidiram mudar por dentro.
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