sábado, 21 de junho de 2025

🎤Entre Entregas e Entrevistas (CONTO)

Jorge acorda todos os dias antes do sol nascer. A cidade ainda boceja, mas ele já está de pé, de tênis gastos, mochila nas costas e um sonho no peito. É office-boy numa das maiores empresas do país, mas seu crachá não traduz quem ele é. O asfalto conhece melhor a sua história do que qualquer currículo. Circula pelas ruas como quem estuda o mundo — não apenas entregando documentos, mas absorvendo detalhes, rostos, palavras, culturas.

Nas pausas entre uma entrega e outra, Jorge anota coisas em um caderninho. Frases soltas, manchetes que ainda não existem, esboços de perguntas que um dia fará ao vivo em frente a uma câmera. Porque Jorge tem um plano: ser repórter esportivo. É a nova face de um sonho antigo — o de ser jogador de futebol — sonho esse que não se realizou após inúmeras peneiras frustradas, mas que não morreu. Apenas mudou de forma. O futebol ainda pulsa forte em sua alma, e talvez, falando sobre o esporte, ele consiga estar tão próximo dele quanto sempre quis.

Jorge estuda jornalismo à noite. Chega à faculdade com os olhos cansados, mas com a mente acesa. Enquanto muitos reclamam da vida, ele agradece pelas oportunidades. Não romantiza a dificuldade, mas a enfrenta com dignidade. Ele sabe que há dias em que tudo pesa: o corpo, o ônibus lotado, o boletim de notas que exige mais tempo de estudo do que o dia permite. Ainda assim, não desiste. Porque cada esforço é um tijolo no caminho que leva até os seus sonhos.

Nas ruas, Jorge conhece gente de todo tipo: o taxista que foi poeta na juventude, a vendedora nordestina que tem três filhos na escola, o imigrante senegalês que sonha em trazer a esposa para o Brasil. Cada pessoa é um universo que Jorge atravessa, escuta, e, de certa forma, registra em sua memória. Ele aprende com essas histórias e sonha em contá-las um dia com o microfone na mão e a voz firme diante da televisão.

Sua jornada é, ao mesmo tempo, simples e épica. Simples porque parece comum aos olhos distraídos. Mas épica porque é repleta de coragem diária, de persistência silenciosa, de fé no invisível. Jorge não tem sobrenome famoso, não tem padrinhos na mídia, não tem uma vida fácil. Mas tem aquilo que não se aprende em nenhuma faculdade: tem paixão, verdade e um propósito.

E é por isso que ele acredita. Acredita que um dia deixará de correr pelas ruas com envelopes e passará a correr entre vestiários e estádios com seu caderno de anotações e sua voz pronta para ecoar no coração de outros jovens sonhadores. Porque Jorge não carrega apenas entregas. Carrega também esperança. E isso, por si só, já é o início de uma grande reportagem.

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