Tem dia que a vida parece uma gaveta bagunçada.
Daquelas que a gente abre sem saber bem o que vai encontrar — um botão perdido, uma fotografia antiga, um bilhete escrito às pressas, uma moeda de outro tempo. Tudo junto, tudo misturado, sem muita lógica aparente. Só memórias guardadas entre as dobras do cotidiano.
É assim também com as histórias que a gente vive.
Tem as coisas simples — como o cheiro do café da manhã, a música que toca no ônibus, o jeito como alguém sorri no meio da rua.
Tem os casos — engraçados, dramáticos, inesperados. O vizinho que canta alto demais, a reunião que virou confissão, a chuva que caiu só no seu lado da cidade.
E tem as crônicas — esses pequenos espelhos da vida, onde transformamos o comum em poesia, o detalhe em enredo, o instante em eternidade.
Coisas, casos e crônicas: o tripé da existência sensível.
Porque viver é isso: esbarrar em coisas que nos afetam sem querer, tropeçar em casos que viram lembranças, escrever crônicas mesmo sem saber que estamos escrevendo.
Às vezes a gente se dá conta disso só depois.
Na mesa do bar, relembrando uma conversa boba.
No meio da noite, revendo mentalmente um abraço.
Ou num dia qualquer, quando uma saudade se disfarça de cheiro de chuva.
A verdade é que todo mundo é um pouco cronista da própria vida.
Mesmo quem nunca escreveu uma linha.
Porque quem sente, observa e guarda — já está, de certa forma, escrevendo.
Coisas, casos e crônicas não precisam ser perfeitas.
Precisam só ser vividas com olhos atentos e coração aberto.
O resto, a gente ajeita depois.
Num caderno, numa conversa ou simplesmente na memória.
E que bom que é assim.
Porque isso significa que a vida — mesmo nas suas partes mais desajeitadas — continua sendo, acima de tudo, cronicamente bela.
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