Tem dias que a vida resolve rimar.
Outros, ela só faz trocadilho ruim e nos deixa com a sensação de que foi escrita por um estagiário cansado da existência.
Pois bem, hoje foi um desses dias — e eu, personagem e vítima, sigo tentando encontrar algum verso que me salve.
Começou de manhã, com o despertador tocando no ritmo do apocalipse. Bati nele como quem bate num inimigo antigo, mas descobri tarde demais que o inimigo real era eu: já estava atrasado.
Na tentativa de me vestir correndo, coloquei a camiseta do avesso e fui sair com dois pés direitos. Literalmente. Dois tênis do pé direito. E eu jurando que o universo queria que eu começasse o dia com o pé certo. Ilusão.
Na padaria, pedi um café forte e uma esperança média. O atendente entendeu “pão com manteiga e sem troco”. Não discuti — já entendi que a comunicação do mundo funciona por livre interpretação poética.
Enquanto esperava, um senhor ao meu lado lia uma crônica de jornal em voz alta, com um entusiasmo digno de teatro grego. O problema é que era uma crônica sobre silêncio e contemplação. Fiquei entre o riso e o respeito, escolhi rir. Silenciosamente, claro.
No ônibus, uma senhora puxou assunto sobre astrologia. Disse que meu ascendente estava em Vênus e minha alma em dívida. Desci três pontos antes por medo de cobrança espiritual.
Cheguei no trabalho com a cara de quem sobreviveu a um reality show. E nem um mísero prêmio.
A vida, às vezes, é isso: um poema sem métrica, com estrofes que não rimam, mas que a gente insiste em declamar com alguma dignidade.
No fim do dia, parei pra refletir (e pra comprar pão, que é o que resta aos poetas falidos). Vi o sol se pondo atrás dos prédios, como se dissesse: “Hoje não fui grande coisa, mas pelo menos terminei bonito”.
E é assim que sigo: entre tropeços e risos, tentando escrever meus versos soltos da vida — esses que não precisam fazer sentido, só precisam fazer companhia.
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