Há um perigo silencioso que nos ronda sem fazer alarde. Ele não grita, não bate na porta, não assusta — ao contrário, se apresenta com roupagens suaves e rotinas bem costuradas. É o hábito. Sim, o hábito. Essa mania da alma de se acostumar com o extraordinário até que ele pareça comum.
Nos esquecemos da beleza de um banho quente depois de um dia difícil. Do café que esquenta as mãos nas manhãs frias e perfuma a casa como se dissesse “bom dia” antes mesmo de alguém o fazer. Do privilégio que é ouvir uma música e sentir que ela nos entende melhor do que qualquer pessoa. Do carinho de um animal que não cobra nada além de nossa presença.
Abraços apertados, pipoca estourando na panela, o conforto de uma casa, a sombra de uma árvore, o calor de um cobertor com cheiro de sol… Quantas vezes passamos por tudo isso sem nem perceber que estamos cercados de milagres discretos?
A imagem nos convida a desacelerar o passo e reaprender a maravilhar-se com o que temos. Ela é um lembrete em forma de rabisco: cuidado para não se acostumar demais. Porque a vida é cheia de coisas incríveis que só parecem normais porque as vivemos com frequência.
É preciso resistir ao automático. Resgatar o espanto. Reencantar-se com o que já é nosso. Porque quando a gente se acostuma demais, o coração se esquece de agradecer. E agradecer é o que nos reconecta com o sentido de tudo.
Portanto, antes que o dia acabe, pare por um segundo. Inspire fundo. Olhe ao redor. O milagre está aí, bem onde você está agora. Só precisa ser visto com olhos despertos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário